Conferência aborda necessidade de reencontro com a natureza

 por Carole  Ferreira*

Alberto Acosta propôs reflexão sobre a crise ecológica global provocada pelo capitalismo

Alberto Acosta falou sobre justiça ambiental e ecológica
    A conferência de abertura do 2º Encontro Interdisciplinar de Comunicação Ambiental (EICA) reuniu professores, pesquisadores, estudantes, jornalistas e comunicadores em torno de reflexões inadiáveis num mundo que passa por uma crise ecológica global. Ao abordar o tema Natureza, “economia verde” e justiça ambiental: dilemas contemporâneos, o economista equatoriano crítico do neoliberalismo, Alberto Acosta, defendeu uma mudança civilizatória como alterativa para evitar o colapso das sociedades capitalistas, baseada no reencontro dos seres humanos com a natureza. A solenidade aconteceu na noite da última segunda-feira, dia 27, no teatro do Colégio Módulo. 

    Presidente da Assembleia Constituinte que escreveu a nova Constituição do Equador, entre outubro de 2007 e julho de 2008, período em que foi ministro de Energia e Minas, Alberto Acosta trouxe para o encontro sua experiência na construção de uma nova concepção de sociedade, contrária ao estilo de vida sustentado pela ideia do progresso antropocêntrico, do consumo e do uso dos recursos naturais como condição para o crescimento econômico. Essa visão de reaproximação com o meio ambiente fez com que o país fosse pioneiro no reconhecimento constitucional dos direitos da natureza. 

  O conferencista iniciou sua fala alertando para a crise ecológica global em função da subordinação capitalista da natureza e do seu interminável processo de acumulação. Em seguida, mostrou que as raízes dessa visão subordinadora são muito antigas e remontam às conquistas do mundo antigo, com o príncipe e rei da Macedônia Alexandre Magno, e à tradição judaico-cristã, que disseminaram a ideia de controle do mundo ao redor do homem. “O sistema capitalista é um sistema de circulação de desigualdades, que faz com que a natureza vire um ativo de especulação e de exploração. O capitalismo em sua face global está mercantilizando tudo”, afirmou. 

    Acosta apresentou dados levantados pela NASA, a agência espacial norte-americana, que mostram a gravidade da situação. Nos últimos 70 anos, o mundo passou a receber o máximo da emissão de CO2. Recentemente, no dia 9 de maio, pela primeira vez essa emissão superou a cifra dos 400 ppms (partes por milhão). “Há um crescimento médio de 2 ppms por ano, o que significa um aumento da temperatura global de pelo menos 4 graus e um incremento do nível do mar em 40 metros. Isso vai levar a impactos sociais e ambientais profundos”, alertou. Entre 2070 e 2100, estão previstas inundações em áreas costeiras, além da salinização e desertificação de florestas, como a amazônica. Os custos com desastres climáticos ambientais devem gerar um prejuízo à economia mundial de 80 milhões de dólares. 

Novos conceitos

   A conferência abordou ainda novos conceitos que começam a despontar na atualidade, forjados numa tentativa de repensar as relações sociedade-natureza. Entre os quais está o de justiça ambiental, vinculado à reparação de pessoas e comunidades mais sujeitas aos impactos negativos da degradação do meio ambiente, e o de bom viver - que postula a harmonia com a natureza e a oposição a valores como consumo, acumulação e crescimento. Este conceito começa a ser discutido na América Latina e propõe a formulação de visões alternativas da vida. A ideia de “economia verde”, que aposta na tecnologia e no desenvolvimento para superação da crise ecológica, é representativa do modelo capitalista vigente e por isso mesmo foi alvo de críticas. 

  Após a fala do conferencista, o público participou ativamente com questionamentos e comentários. As perguntas formuladas abordaram as mais diversas temáticas, como: punições, sanções e maior controle social em relação aos crimes ambientais; as aproximações dos discursos ambientais com as estratégias de marketing; a hegemonia desenvolvimentista no pensamento econômico; e o papel da democracia na construção de uma mudança civilizatória. Também se abordou a necessidade de reduzir a exploração de petróleo no mundo, a partir do exemplo de Acosta, que, quando ministro, ajudou a impedir a exploração das reservas petrolíferas no campo amazônico Ishpingo-Tambococha-Tiputini (ITT), no parque nacional Yasuní, estimadas em um bilhão de barris.

Mesa de abertura

    A mesa abertura foi composta antes do início da conferência e contou com a participação do representante da recém-criada Secretaria Municipal de Meio Ambiente, o jornalista César Gama, da coordenadora geral do 2º Encontro Interdisciplinar de Comunicação Ambiental, a professora Sonia Aguiar Lopes, e do representante da Universidade Federal de Sergipe (UFS), o coordenador do Programa de Pós-graduação em Comunicação (PPGCOM) Carlos Franciscato.

   César Gama ressaltou a importância de a universidade promover eventos como esse e da conscientização dos cidadãos em torno das questões ambientais. Na sua fala, colocou como graves problemas a serem enfrentados pela atual administração a baixa cobertura arbórea do município e a ingerência do setor de construção civil na área ambiental. “Os seres humanos acham que o meio ambiente deve estar à nossa disposição, a serviço do lucro. Nossa gestão em Aracaju quer mostrar que o meio ambiente deve ser respeitado ao extremo”, enfatizou.

    A professora Sonia Aguiar comemorou a qualidade dos trabalhos apresentados no EICA e o crescimento do número de participantes. Na primeira edição, em 2011, foram aprovados 38 trabalhos e ocorreram sete sessões de apresentação. Este ano, foram 48 trabalhos aprovados e 10 sessões. Pesquisadores de 16 estados brasileiros, além do Distrito Federal e de Sergipe, vão participar das dez sessões de comunicação oral, nesta terça e quarta, na didática 4 da Universidade Federal de Sergipe. Algumas das temáticas a serem abordadas são: controvérsias científicas sobre aquecimento global e mudanças climáticas; abordagem ecocrítica no cinema ambiental; comunicação de riscos socioambientais; ativismo político-ambiental e contra-agendamento midiático.

  Sonia Aguiar disse que o encontro tem cumprido sua função de reunir e apresentar à comunidade acadêmica e ao meio profissional os pesquisadores das várias partes do Brasil que estão pensando e refletindo sobre as mais diversas vertentes da comunicação ambiental, além de oferecer uma oportunidade de qualificação para jornalistas e comunicadores. “Tivemos trabalhos diversificados, interessantes e originais, que tratam de questões ainda não incorporadas ou suficientemente discutidas no campo da comunicação ambiental. Agradeço a todos que estão aqui e fazem o EICA existir”, comemorou.



   O professor Franciscato ressaltou que o recém-criado Programa de Pós-graduação em Comunicação da UFS incorpora temas de qualidade na área intradisciplinar, como a comunicação ambiental. Por entender que as questões ligadas à comunicação são abrangentes e, muitas vezes, ultrapassam a fronteira da mídia, há uma tendência de pensa-las a partir da interface com outras disciplinas. “Que o encontro tenha reflexões fervorosas e discussões agudas, cumprindo a vocação da pós-graduação no país. O PPGCOM irá dar seu respaldo para que as pesquisas se desenvolvam, buscando outras contribuições quando as questões não puderem ser resolvidas por uma disciplina única”, afirmou. 

   A realização do 2º EICA é uma iniciativa do Laboratório Interdisciplinar de Comunicação Ambiental (LICA), em parceria com o Programa de Pós-graduação em Comunicação da UFS. O evento conta com o apoio financeiro da Fundação de Apoio à Pesquisa e à Inovação Tecnológica do Estado de Sergipe (Fapitec-SE).